sábado, 27 de abril de 2013

Do macarrão com água de chuveiro até o Fla: lições do 'psicólogo' Shilton

Após sair da casa dos pais aos 13 anos para jogar basquete, pivô usa sua superação para motivar companheiros e sonha em se formar em psicologia. À distância, o pivô Shilton assusta. Seja pelos 105kg de pura massa muscular distribuídos por seus 1,98m de altura, pelos braços cobertos por inúmeras tatuagens ou pela cara de mau com que encara os adversários que ousam penetrar no garrafão do Flamengo. Mas basta uma rápida aproximação e um papo de cinco minutinhos para descobrir que o estereótipo de bad boy, somado ao seu jeitão bronco, não se encaixa no verdadeiro perfil desse matogrossense de Cuiabá. Aos 30 anos, Shilton comeu o pão que o diabo amassou, ou para ser mais exato, muito macarrão com água de chuveiro, para alcançar seus objetivos como jogador de basquete. Os obstáculos não foram poucos, tampouco fáceis de serem superados, mas ele garante que valeu a pena. No entanto, mais importante do que conquistar títulos, passar por todas as seleções de base ou vestir uma camisa de peso como a do Flamengo é poder se olhar no espelho e ter orgulho de servir como exemplo para os filhos Mathias, de cinco anos, e Guilherme, de um ano e nove meses. Mesmo exemplo que ele passa diariamente para Diego, Feliz, Alexandre e Chupeta, promessas do time rubro-negro, que inicia na próxima semana a disputa das quartas de final do NBB, contra o Paulistano. Depois de deixar a casa dos pais em Cuiabá aos 13 anos para jogar basquete na capital paulista, sem receber um tostão sequer, e morar dois anos debaixo das arquibancadas do ginásio do Ibirapuera, Shilton não dá descanso para os jovens companheiros, que veem no camisa 6 a figura de um pai. Eu pego no pé deles mesmo. Quando cheguei em São Paulo para jogar pelo Círculo Militar passei dois anos dormindo numa edícula - uma espécie de quarto minúsculo sem janela e nenhuma ventilação - e comendo miojo com água do chuveiro todos os dias. Quando fui morar debaixo das arquibandas do Ibirapuera, já achei um luxo. Lá pelo menos eu tinha uma cama só para mim. Eles davam escola, transporte e eu ganhava R$30 por mês do meu pai. Minha única diversão era ir para o Parque do Ibirapuera assistir a shows gartuitos. Hoje, o basquete mudou e esses moleques têm toda a estrutura necessária que um atleta precisa para jogar. Por isso, eu cobro deles determinação e foco nos treinos. Eles têm potencial, mas precisam querer mais que os meninos das outras equipes. Sei que tem muito jogador melhor espalhado por aí, mas nenhum deles quer mais do que eu dentro de quadra. Encaro qualquer partida como se fosse um prato de comida - afirmou Shilton. Se o apetite do camisa 6 do Flamengo dentro de quadra está diretamente ligado às barreiras que teve de superar ao longo de 12 anos de carreira, o grau de instrução e o alto nível cultural vêm de berço. Estudioso e fascinado pela leitura desde pequeno, Shilton diz que sempre conviveu bem com a fama de nerd que o acompanhou durante toda a adolescência e revela uma antiga paixão que espera pôr em prática quando aposentar a munhequeira. - Sempre gostei de ler. Adorava os livros de filosofia, mitologia grega, aquelas histórias do Minotauro. Desde a 8ª série quero ser psicólogo. Prestei vestibular e passei na USP, PUC-SP e Mackenzie, mas jogava no Pinheiros, na época, e eles me ofereceram uma bola de estudos na UNIP. Fiz dois anos de psicologia lá e mais um em Campos, mas depois não consegui mais conciliar e tranquei. Quem sabe um dia eu consiga me formar e trabalhar com psicologia no esporte - planeja o jogador do Flamengo. Mais do que respeito pela história de superação do companheiro, as jovens promessas rubro-negras não escondem a admiração por Shilton. Apesar de ser o principal alvo do experiente pivô, Feliz diz que encara as duras críticas e, principalmente, os conselhos como um aprendizado a mais. - Ele pega demais no meu pé, mas é bom saber que tem alguém para chamar nossa atenção. Sei que ele faz isso porque gosta de mim e acredita no meu potencial. Procuro usar o exemplo dele como um estímulo para minha carreira. Como não passamos pelas dificuldades que ele passou, temos que dar ainda mais valor de estar num clube como o Flamengo - disse o pivô de apenas 22 anos. Ao mesmo tempo que as dificuldades do começo da carreira fizeram do jogador uma fortaleza dentro de quadra, elas o transformaram num homem decidido, simples e de bem com a vida. O sorriso escancarado e o bom humor constante desmontam num piscar de olhos o mito do cara bronco e casca grossa que chama atenção nos jogos do Flamengo. - Sou um cara tranquilo e fora de quadra dificilmente você vai me ver bravo, nervoso ou de mau humor. Até engarrafamento eu encaro numa boa. Nada me incomoda, mas quando viro o fio é complicado. Sei que muita gente me acha violento, um jogador de m..., mas apesar de todas as dificuldades que enfrentei, me tornei um jogador de basquete. Saí da casa dos meus pais aos 13 anos atrás de um sonho e consegui realizá-lo. Eu me considero um vencedor - orgulha-se Shilton. Casado há sete anos com Georgia - juntos há 12 - o pivô que ao mesmo tempo se sente culpado quando fala um palavrão em casa na frente de um dos filhos rejeita o rótulo de jogador violento: - Eu jogo duro sim, mas nunca fui violento e não saio por aí dando cotovelada em ninguém dentro de quadra - finalizou o pivô.(globoesporte.com)

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